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Por Adhemir Marthins

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terça-feira, 7 de julho de 2015

JESUS CRISTO... O SOL. A IGREJA... A LUA

A natureza da Igreja simbolizada em uma imagem: a Lua.        Joseph Ratzinger 

 

Chamou muito a atenção dos meios de comunicação o pensamento conclusivo, nesse domingo, do Papa Francisco sobre a Lua que não brilha com luz própria no seu discurso de boas-vindas a Quito, no Equador.


O papa disse: "Amigos todos, começo com expectativa e esperança os dias que temos pela frente. No Equador, está o ponto mais próximo do espaço exterior: é o Chimborazo, chamado, por isso, como o lugar 'mais perto do Sol', da Lua e das estrelas. Nós, os cristãos, identificamos Jesus Cristo com o Sol e a Lua com a Igreja. E a Lua não tem luz própria. E, se a Lua se esconde do Sol, torna-se escura. O Sol é Jesus Cristo. E, se a Igreja se afasta e se esconde de Jesus Cristo, torna-se escura e não dá testemunho. Que nestes dias torne-se mais evidente para todos a proximidade do Sol que nasce do alto" (Lc 1, 78) e que sejamos um reflexo da sua luz, do seu amor".

Repropomos um texto do cardeal Jospeh Ratzinger, em que ele reflete sobre essa imagem da Lua e do Sol, a Igreja e Jesus.

O artigo foi publicado no sítio Il Sismografo, 06-07-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto.


Eis o texto.


Uma Igreja que, contra toda a sua própria história e a sua própria natureza, seja considerada apenas politicamente não tem sentido algum, e a decisão de permanecer nela, se for puramente política, não é leal, mesmo que se apresente como tal.

Mas, diante da situação atual, como se pode justificar a permanência na Igreja? Em outras palavras: a escolha em favor da Igreja, para ter sentido, deve ser espiritual. Mas sobre quais motivos ela pode se assentar hoje?

Gostaria de dar uma primeira resposta recorrendo a uma nova comparação e a uma observação anterior. Dissemos que, nos nossos estudos, já nos aproximamos de tal forma da Igreja que não conseguimos mais discernir as linhas gerais, nem vê-la no seu conjunto. Aprofundemos esse pensamento, remetendo-nos a um exemplo, com o qual os Padres alimentaram a sua meditação sobre o mundo e sobre a Igreja.

Eles explicaram que, no mundo material, a Lua é a imagem daquilo que a Igreja representa para a salvação do mundo espiritual. Aqui, é retomado um antigo simbolismo constantemente presente na história das religiões (os Padres nunca falaram de "teologia das religiões", mas a implementaram concretamente); nele, a Lua, como símbolo da fecundidade e da fragilidade, da morte e da caducidade das coisas, mas também da esperança no renascimento e na ressurreição, era a imagem, "patética e, ao mesmo tempo, consolante" [1], da existência humana.

O simbolismo lunar e o telúrico muitas vezes se fundem. Na sua fugacidade e no seu renascimento, a Lua representa o mundo terreno dos homens, este mundo que é continuamente condicionado pela necessidade de receber e que obtém a própria fecundidade não de si mesmo, mas do Sol; representa o próprio ser humano, que se expressa na figura da mulher, que concebe e é fecunda por força da semente que recebe.

Os Padres aplicaram o simbolismo da Lua à Igreja sobretudo por duas razões: pela relação Lua-mulher (mãe) e pelo fato de que a Lua não tem luz própria, mas a recebe do Sol, sem o qual ela seria completamente escura.

A Lua resplandece, mas a sua luz não é dela, mas de outro [2]. É trevas e, ao mesmo tempo, luz; mesmo sendo por si só escura, ela dá esplendor em virtude de outro do qual reflete a luz. Precisamente por isso, ela simboliza a Igreja, que também resplandece, embora por si só seja escura; não é luminosa em virtude da própria luz, mas do verdadeiro Sol, Jesus Cristo, de modo que, embora sendo apenas terra (a Lua nada mais é do que outra terra), é igualmente capaz de iluminar a noite da nossa distância de Deus – "A Lua narra o mistério de Cristo" [3].

Os símbolos não devem ser forçados; a sua eficácia está totalmente naquela imediaticidade plástica que não se pode enquadrar em esquemas lógicos. No entanto, nesta nossa época de viagens ao espaço, é espontâneo aprofundar essa comparação, que, confrontando a concepção física com a simbólica, enfatiza melhor a nossa situação específica em relação à realidade da Igreja.

A sonda lunar e o astronauta descobrem a Lua apenas como terra rochosa e desértica, como montanhas e como areia, não como luz. Com efeito, ela é em si mesma apenas deserto, areia e rochas. No entanto, por mérito de outros e em função de outros ainda, ela também é luz e como tal permanece mesmo na era dos voos espaciais. Portanto, ela é aqui que, em si mesma, não é. Embora pertencendo a outros, essa realidade também é sua. Existe uma verdade física e uma simbólico-poética, uma não elimina a outra.

Não seria essa, talvez, uma imagem exata da Igreja? Quem a explora e a escava com a sonda espacial descobre apenas deserto, areia e terra, as fraquezas do homem, a poeira, os desertos e as alturas da história. Tudo isso é seu, mas não representa ainda a sua realidade específica.

O fato decisivo é que ela, mesmo sendo apenas areia e rochas, também é luz por força de outro, do Senhor: aquilo que não é seu é verdadeiramente seu e a qualifica mais do que qualquer outra coisa; ou melhor, a sua característica é justamente a de não valer em si mesma, mas apenas por aquilo que nela não é seu, por existir em algo que está fora dela, de ter uma luz, que, embora sendo sua, constitui toda a sua essência. Ela é "lua" – misterium lunae – e, como tal, interesse às pessoas que creem porque justamente isso exige uma constante escolha espiritual.

Como o significado contido nessa imagem parece-me de importância decisiva, antes de traduzi-lo em afirmações de princípio, prefiro esclarecê-lo melhor com outra observação.

Depois da tradução da liturgia da missa, ocorrida após a última reforma, recitando o texto prescrito, eu encontrava todas as vezes uma dificuldade, me parece esclarecer ainda mais o assunto do qual estamos nos ocupando. Na tradução do Suscipiat, diz-se: "Receba o Senhor por tuas mãos este sacrifício (…) para nosso bem e de toda a santa Igreja". Eu sempre fui tentado a dizer "e de toda a nossa santa Igreja".

Reaparece aqui todo o nosso problema e a mudança que foi operada nesse último período. No lugar da sua Igreja, entrou a nossa e, com ela, as muitas Igrejas; cada um tem a sua. As Igrejas se tornaram empresas nossas, das quais nos orgulhamos ou nos envergonhamos, pequenas e inumeráveis propriedades privadas dispostas uma ao lado da outra, Igrejas apenas nossas, nossa obra e propriedade, que nós conservamos ou transformamos à vontade. Por trás da "nossa Igreja" ou até da "vossa Igreja" desapareceu a "sua Igreja".

Mas é precisamente e apenas esta que interessa; se ela não existe mais, a "nossa" também deve abdicar. Se fosse apenas a nossa, a Igreja seria um supérfluo brinquedo de criança.


Notas:

1. M. Eliade, Die Religionen und das Heilige, Salzburg, 1954, p. 215 [trad. it., Trattato di storia delle religioni, Boringhieri, Torino 1954, p. 192]. Cfr. o capítulo inteiro: Mond und Mondmystik, pp. 180-216 [trad. it cit., pp. 158-192 (La luna e la mistica lunare)].

2. Cfr. H. Rahner, Griechische Mythen in christlicher Deutung, Darmstadt, 1957, pp. 200-224 [trad. it., Miti greci nell’interpretazione cristiana, Il Mulino, Bologna 1971, 189-197]; Id., Symbole der Kirche, Salzburg 1964, pp. 89-173 [trad. it., L’ecclesiologia dei Padri. Simboli della Chiesa, Paoline, Roma 1971, pp. 145-229]. É interessante a observação segundo a qual a ciência antiga discutiu longamente sobre a questão se a Lua tinha ou não luz própria. Os Padres da Igreja defenderam a tese negativa, que se tornou comum, enquanto isso, assim como a interpretação em sentido teológico-simbólico (cfr. especialmente p. 100 [trad. it., L’ecclesiologia dei Padri, cit., 161ss.).

3. Ambrosius, Exameron IV 8, 32, CSEL 32, 1, p. 137. Z 27ss. [trad. it, I sei giorni della creazione, in Opera omnia di Sant’Ambrogio 1, Ambroniana – Città Nuova, Milano-Roma 1979, 231], Rahner, Griechische Mythen, cit., p. 201 [trad. it. cit., p. 192].

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